Pense onde planta seus coqueiros hoje, para colher amanhã

Maurício Magalhães

Administrador com pós-graduação em Marketing. CEO da Giros Filmes, sócio da Mundo Real e ex-CEO da Agência TUDO. Um dos mais reconhecidos profissionais de Marketing do País

Escreve a coluna Marketing aplicado

Pense onde planta seus coqueiros hoje, para colher amanhã

Publicado em 18/01/2021

Na temporada de final de ano, um amigo, em roda de conversa despretensiosa, nos contou sobre uma notícia que tinha lido e não lembrava onde: era sobre vinícolas francesas estarem comprando terras ao norte da Inglaterra em função da projeção do clima anos à frente, face ao aquecimento global. Era uma decisão estratégica tomada hoje, em perspectiva de possíveis problemas futuros que, se de fato ocorrerem, tornará inviável a produção de uva onde hoje os plantios são cultivados.

Aqui pouco importa a fidedignidade da notícia ou a fonte, a verdade é que, em tese, tem sentido claro esse pensamento estratégico. Há muito li sobre como a Shell faz, há décadas, planejamentos para 30 anos à frente com muita eficácia, fundamental para perpetuação dessa organização.

Inevitavelmente na mesa de almoço o debate foi iniciado sobre os por quês de o nosso país ser tão imediatista e praticamente não ter um projeto de futuro, um projeto de nação.

Insisti no assunto, o qual amo, e lembrei de uma experiência que vivi. Em 2014, fui ao Polo Sul com a Marinha do Brasil e fiquei chocado positivamente como essa instituição tem uma inteligência estratégica incrível. Os oficiais com quem convivi nos inesquecíveis sete dias que passamos juntos, na Estação Comandante Ferraz e no navio Polar Almirante Maximiano, me relataram que essa “inteligência” de nação está na Marinha do Brasil há mais de 200 anos. Eles me deram vários motivos para mantermos no Polo Sul essa estação de pesquisa, fruto de uma determinação da ONU e seus países membros, no qual só terá direto a um debate no futuro sobre essa rica região do planeta os países que tiverem, pelo menos, 50 anos de pesquisa. A decisão brasileira, décadas atrás, teve as digitais da insistência da Marinha.

Por que não ouvimos e praticamos os conceitos “das Marinhas” e somos “assim mesmo, sem jeito”?

As teses de todos eram sempre no gerúndio e sempre na 3ª pessoa do singular ou do plural ou na 1ª pessoa do plural, ou seja: ele, eles e nós. Tipo: o Brasil não tem jeito, nossos políticos são assim, lutamos para sobreviver no hoje, carregamos um DNA de egoísmo etc. Resumindo, terceirizamos nosso olhar para o outro. Fiz então a seguinte pergunta: e eu? E cada um de vocês? Como penso e pensam, em minha e nas suas vidas?

O grupo era eclético e quase todos tinham a mesma mecânica do Brasil, pensam o hoje, acreditando que alguma força maior nos ajudará na vida, que as coisas no fim da linha se resolvem em finais felizes. Carregamos um “Q” de messianismo, esperando um Messias salvador.

Na prática, e dando destino real de escolhas individuais, falo de saúde, de como se cuidar e melhorar padrão de alimentação ou fazer atividade física sistemática. Falo de gerar poupança, em guardar dinheiro para o futuro ou, ainda, de como irrigar amizades para uma vida. Um dia a conta chega, para o que fazemos ou não em cada um desses itens. A maior parte dos meus amigos e parentes agem “como se não houvesse amanhã” e, pior, reclamam da vida nos quesitos que cito. Ao longo da minha trajetória ouvi muito “que sorte você deu”. Sorte? Trabalhando 40 anos quase sem férias, durante 10 horas por dia? Abdicando de muitas escolhas de consumo presente e treinando para manter a saúde, com ou sem vontade?

Incrível como não associam que o modelo mental da decisão das vinícolas francesas é o mesmo que deveríamos ter em relação as nossas vidas, ou ainda que não existe um país etéreo chamado Brasil, que nosso País é o somatório de cada um de nós, portanto, se fizermos nossos planejamentos para melhorar nosso futuro, em cadeia teremos mais Marinhas do Brasil em nosso Brasil.

Na Marinha aprendi também o conceito da pauta do Hoje, com os desafios de inúmeros assuntos (até final do ano), do Amanhã (próximos 5 anos) e do Futuro, poucos assuntos que precisamos fazer hoje para gerações futuras (próximos 30 anos). Todo oficial só é promovido se cumprir as metas anuais das 3 pautas. Genial.

Face a esse aprendizado, copiei e implantei essa metodologia do Hoje e do Amanhã e ainda não consegui fazer a do Futuro, mas chegarei lá.

Sou neurótico por estratégia. Instintivamente em toda minha vida estive no futuro e tomando decisões no presente, não sei mesmo porque. Joana, minha filha, diz que é por ser eu de aquário. Acho que, por viver no futuro e vislumbrá-lo sob minha ótica, trabalhei para construí-lo. A verdade é que hoje, com 60 anos, vejo grandes acertos que tive, graças a muitas decisões que tomei em prol de um futuro (muitos desses futuros já viraram presente).

Por fim, um caso que lembro sempre. Quando Joana tinha 15 anos, na nossa casa de praia, falava com ela sobre estratégia, em uma conversa de pai dizendo os cuidados que ela deveria ter em sua vida com esse olhar de futuro, sem deixar de aproveitar e viver o presente.

Percebi que ela entendia burocraticamente e me olhava com o olhar tipo “pai, estou prestando atenção, mas sem entender muito”, quando olhei para o lado e vi dois coqueiros. Virei para ela e disse: “Filha, lembra quando Reizinho (nosso ex-motorista) nos deu de presente aquelas duas mudas de coqueiro? Pois bem, se eu tivesse tipo uma visão estratégica, hoje caberia uma rede entre ambos. Como não tive, nos privamos desse prazer 10 anos depois”. Resposta: “agora entendi”.

E até hoje falamos onde plantaremos nossos coqueiros de hoje. Comece refletindo onde plantará seus coqueiros, assim ajudará a você mesmo e, seguramente, ao seu País.

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