Trocas de experiências que aprimoram o conhecimento - CRA-SP
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Trocas de experiências que aprimoram o conhecimento

Para se manterem competitivas, eficientes e alinhadas às tendências do mercado, muitas organizações estão aderindo a programas de mentoria (mentoring) voltados ao negócio. Trata-se de um processo de desenvolvimento dos colaboradores no qual um profissional com mais experiência aconselha, orienta e acompanha aqueles menos experientes, mas com potencial de crescimento. 

Um exemplo do quanto essa modalidade de formação está em alta no cenário organizacional vem da pesquisa FEEx - Fia Employee Experience 2023, que revelou que das 150 organizações vencedoras do Prêmio Lugares Incríveis para Trabalhar, promovido pelo UOL e pela FIA, 51% ofereciam um programa formal de mentoria para os colaboradores considerados talentos.

Além do desenvolvimento dos colaboradores, a mentoria aumenta a produtividade, fortalece a cultura organizacional, amplia o networking, otimiza as competências individuais e ajuda na retenção de talentos. “Profissionais que recebem mentoria se sentem mais confiantes ao propor ideias criativas e inovadoras, que podem ser fonte para ajustes de processos, criação de novos produtos ou melhorias nas linhas existentes. Já as empresas tendem a superar os objetivos estabelecidos, com um ambiente de trabalho mais colaborativo e eficiente. Outro ganho está no processo de sucessão que, em geral, tem alto custo e leva tempo para contratar um profissional alinhado com os valores e a cultura da organização. Por meio da mentoria, os futuros líderes são preparados para assumirem novas posições”, afirma a Admª Noscilene Santos, coordenadora do Grupo de Excelência em Coaching e Mentoring - GEC, do CRA-SP.

Entre as competências mais trabalhadas nas mentorias, segundo Ana Paula Cortat Zambrotti Gomes, docente de MBAs da Fundação Getulio Vargas - FGV, estão a liderança, comunicação, negociação, gestão de equipes e capacidade de resolver problemas complexos. “Além disso, quando a relação mentor e mentorado é próxima, os envolvidos acabam se beneficiando com a melhoria das relações interpessoais, o que favorece uma cultura de colaboração.”

Lina Nakata

Quem pode participar 

Os programas de mentoria geralmente são destinados a profissionais avaliados como grandes potenciais para a empresa. De acordo com a Admª Lina Nakata, docente da Fia Business School, na medida em que a empresa cria vários ciclos do processo de mentoria, ela pode atender grupos mais amplos e até segmentar pelas necessidades como, por exemplo, para pessoas negras, mulheres, entre outras.

Os mentores, em geral, são profissionais aptos para compartilhar suas experiências com os colaboradores que demonstram habilidades para seguir carreira na organização ou, ainda, aqueles que precisam de apoio para aumentar a produtividade, desenvolver competências, mudar de carreira ou elevar a autoestima. “Como a mentoria se fundamenta em experiências e conhecimento consolidado na área de interesse do mentorado, qualquer profissional pode se voluntariar e dispor parte do seu tempo para apoiar o desenvolvimento dos colaboradores”, comenta Noscilene.

Para acertar na escolha do mentor, o profissional interessado pode recorrer ao RH para buscar mais informações sobre a pessoa que irá acompanhar o seu progresso. “O mentorado deve buscar alguém que o inspire e tenha histórias para contar sobre os caminhos que o levaram a alcançar resultados”, sugere a coordenadora do GEC.

Tipos de mentoria

Entre as opções de mentorias disponíveis, Noscilene destaca a individual, na qual o RH faz o match entre mentor e mentorado. Há também o formato em grupo, que reúne entre quatro e cinco profissionais interagindo entre si, sob o olhar e escuta do mentor, que poderá potencializar o aprendizado.

Outra modalidade que vem ganhando cada vez mais espaço nas organizações, devido aos programas de diversidade e inclusão, é a mentoria reversa. Segundo a docente da FGV, o conceito também envolve aprendizado, compartilhamento de conhecimento, orientação e apoio. Porém, nessa vertente os mentores e mentorados são profissionais com conhecimentos e necessidades mais específicas. “Um jovem profissional pode ser mentor de um diretor ou de um colaborador com mais tempo de carreira, que necessita adquirir ou aprimorar competências relacionadas a tecnologias ou a novas gerações, por exemplo”, explica. 

Ana Paula diz, ainda, que a mentoria reversa tem sido usada em ações voltadas à liderança feminina, gerações, questões relacionadas à raça, orientação afetiva sexual, entre outros marcadores de diversidade que exigem conhecimentos. “Muitas vezes, profissionais que ocupam posições mais estratégicas ainda precisam se desenvolver ou atualizar nessas questões”, diz a docente.

        Noscilene Santos

Como estruturar um programa de mentoria

Antes de dar início à estruturação do programa é aconselhável a realização de um diagnóstico organizacional, com levantamento preciso dos objetivos e necessidades da empresa. “Essa identificação permitirá escolher o processo de desenvolvimento das pessoas que mais se adequa à realidade da organização. Uma escolha precipitada poderá levar a resultados indesejados e gerar frustração. Além disso, é imprescindível que a empresa tenha uma cultura voltada para a gestão do conhecimento”, indica Ana Paula.

A partir da definição dos objetivos, complementa a coordenadora do GEC, o RH consegue determinar os resultados que deseja alcançar, identificar o público-alvo, estabelecer critérios sobre a combinação de mentor e mentorado, a duração e o formato do programa, além de estabelecer se ele será estruturado internamente ou se contará com a contratação de uma consultoria especializada. 

Para colocá-lo em prática, Lina menciona a importância de ter um patrocinador ou patrono da ideia, para dar o devido suporte ao projeto. O próximo passo é identificar se a empresa conta com mentores relevantes disponíveis, bem como o público que irá receber a mentoria. “Dessa forma, realiza-se o matching - combinação das duplas de mentores e mentorados, considerando não apenas objetivos ou atuações em comum, mas também a compatibilidade de horário e a missão de vida que tenha alguma conexão. Se não houver química, o programa não será bem-sucedido. Ao se conhecerem, as duplas passam a interagir. O papel da empresa é treinar o pessoal, acompanhar e monitorar os resultados”,  explica a docente da FIA.

Para driblar os desafios que podem surgir ao longo da implementação do programa, Lina afirma que a operacionalização precisa ser eficiente e isso engloba desde o momento da comunicação interna, das inscrições, até o acompanhamento do projeto, com identificação de indicadores. “Se o programa não se mostrar positivo, a chance dele deixar de existir é grande”, pontua.

Como avaliar os resultados 

Os resultados da inserção do programa em uma organização podem ser mensurados por meio de alguns indicadores. Entre eles, Lina cita a possibilidade de avaliar o número de mentores e mentorados inscritos, a quantidade de sessões realizadas, o NPS - Net Promoter Score (para medir a satisfação com o programa), o comprometimento da dupla e o avanço da carreira dos mentorados após um ou dois anos do fim do projeto, entre outros tópicos.

A obtenção de resultados, segundo Ana, é um grande desafio, pois a mentoria é um processo e não um produto acabado. Para ela, o sucesso depende de questões objetivas, como a identificação das necessidades dos profissionais envolvidos, mas também de fatores subjetivos, de caráter comportamental. “É um processo de desenvolvimento de pessoas, ou seja, demanda tempo. A pressão por resultados rápidos é um dos principais motivos pelos quais alguns programas naufragam”, explica.

A docente diz, ainda, que os resultados se tornam notáveis quando o mentorado ganha confiança e começa a fazer sozinho o que antes realizava com o apoio do mentor. Para que isso aconteça de fato, a permissão para o erro deve existir. “Punir o erro não favorece o aprendizado e, consequentemente, um programa de mentoria. Para que os resultados que foram planejados no início do processo apareçam, são pré-requisitos uma cultura voltada para a gestão do conhecimento, a valorização da colaboração e o entendimento do erro como fonte de aprendizado”, orienta Ana.

Isabela Marques

Exemplo a ser seguido

Na Kimberly-Clark, organização multinacional de produtos voltados aos cuidados pessoais, o desenvolvimento e evolução dos colaboradores faz parte das prioridades. Os programas de mentoria da empresa, tanto reversa quanto tradicional, visam promover a troca de experiências, como também melhorar as soft skills que ajudam os colaboradores a agir em concordância com os valores e cultura da organização, aprimorando competências como flexibilidade, empatia e trabalho em equipe. “Acreditamos que uma troca diversa de pensamentos, backgrounds e cultura gera um ambiente mais inovador e acolhedor, no qual todos são inspirados a realizar seu melhor trabalho e se sintam valorizados. Assim, buscamos crescer incentivando o desenvolvimento de nossos profissionais, especialmente aqueles que buscam cargos de gestão”, comenta Isabela Marques, gerente de Talent Management da Kimberly-Clark no Brasil.

O programa de mentoria da corporação, segundo Isabela, foi estrategicamente estruturado com o foco em desenvolver lideranças, conquistar talentos e promover inclusão, equidade e diversidade em diversos aspectos da cultura organizacional. 

Por lá, todos os profissionais podem participar das mentorias, no entanto, para facilitar algumas trocas, a companhia criou programas destinados a públicos específicos. “O Women Mentoring Women, por exemplo, conecta mulheres líderes de nível sênior com gestoras de outras hierarquias, visando o desenvolvimento da próxima geração de lideranças femininas, em todos os setores. Neste ano, o programa contou com 89 mentoradas e 75 mentoras”, diz Isabela.

Com um quadro de funcionários cada vez mais diverso e plural, a Kimberly-Clark conta com cinco grupos multifuncionais formados por pessoas de todos os cargos, que desenvolvem e implementam atividades dedicadas às suas respectivas pautas: gênero, raça, LGBTQIAPN+, PCD e gerações. “Fomentamos uma cultura inclusiva por meio de programas que promovam maior compreensão dos tópicos de diversidade, como a mentoria reversa para líderes seniores”, explica a gerente.

Isabela conta que os maiores desafios na implementação da mentoria na organização estão relacionados à cultura de aprendizagem e à administração do tempo. “Nosso foco agora está em trabalhar e incentivar a capacitação contínua, destacando para os colaboradores a importância de adquirir novas competências e aperfeiçoar as que já possuem. As pessoas precisam ver valor nas ações de desenvolvimento e priorizar isso em suas agendas”, conclui a gerente.




Revista Administrador Profissional - ADM PRO
Publicação física com periodicidade trimestral
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