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Enfim, dono do próprio dinheiro

Instituído pelo Banco Central, o Open Banking permitirá a troca de informações entre as instituições financeiras e dará autonomia para o cliente construir o seu próprio banco 

Com o propósito de transformar o sistema financeiro brasileiro, tornando-o mais eficiente, competitivo e inclusivo, o Banco Central - BC instituiu o Open Banking (ou Sistema Financeiro Aberto), novo modelo de operação que propicia o compartilhamento de dados de clientes entre as instituições, por meio da abertura e integração de seus respectivos sistemas. 

Ao contrário do modelo atual, no qual os bancos detêm as informações financeiras de seus usuários, o Open Banking tem a premissa de que o consumidor é o dono dos seus dados e, por este motivo, o novo sistema permitirá que ele tenha liberdade para compartilhar suas informações entre diferentes instituições autorizadas pelo BC podendo, ainda, escolher os melhores preços, produtos e serviços, com menos custos e mais transparência. 

Embora seja novidade no País e permaneça desconhecido por boa parte da população, o Open Banking já é utilizado em vários países do mundo, fator que influenciou a construção das particularidades do projeto brasileiro.  

Fases de implantação 

Dada a complexidade do processo, o Banco Central optou pela implementação do Open Banking em quatro fases. A primeira delas teve início em fevereiro deste ano e envolveu apenas as instituições. “Elas compartilharam entre si o conjunto de produtos e serviços que oferecem, incluindo as taxas envolvidas nestas operações”, explica o superintendente geral da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais - ANBIMA, José Carlos Halpern Doherty.

Já a segunda fase, que teve seu início alterado para 13 de agosto, envolve o compartilhamento de dados cadastrais e transacionais de clientes, tanto de pessoas físicas quanto jurídicas. “Com o consentimento prévio do usuário, os bancos passarão a compartilhar entre si informações como nome, CPF, endereço e telefone, além de dados financeiros relacionados à conta corrente, histórico bancário, operações de crédito e afins”, revela Doherty.

     José Carlos Halpern Doherty

Na terceira fase, programada para 30 de agosto, tem início o compartilhamento de transações entre as instituições participantes. “A partir dela será possível ter acesso a pagamentos em diversos canais e não apenas na sua instituição. Será possível, por exemplo, realizar pagamentos em um banco usando o saldo da conta de outra instituição”, complementa o superintendente.

Por fim, na quarta fase, prevista para começar em dezembro de 2021, haverá a possibilidade de compartilhar dados referentes a serviços de credenciamento, seguros, previdência, câmbio e produtos de investimentos. “É o que chamamos de Open Investment. Nesta etapa, a instituição abre para as demais as informações do seu portfólio de produtos e o cliente, se quiser, pode dar o consentimento para o compartilhamento de sua carteira. Assim, a instituição concorrente conseguirá ver, por exemplo, a taxa que o cliente paga por um determinado produto e oferecer uma tarifa mais baixa para ele. Por isso que o Open Investment tem potencial de estimular a concorrência e promover uma revolução na oferta de produtos e serviços”, acrescenta Doherty.

Benefícios

Com a troca de informações mais fluida entre as instituições, o Open Banking favorece a criação de novos modelos de negócios e serviços customizados às necessidades dos clientes. “Uma empresa, por exemplo, pode oferecer o serviço de consolidação de investimentos, para que o cliente consiga ‘enxergar’ tudo em um único lugar”, comenta o superintendente da ANBIMA.

              Emanuela Ramos

Outro ponto relevante é que o Open Banking dará abertura para que os bancos e instituições financeiras tenham a oportunidade de atingir uma gama muito maior de clientes. “Essa é uma grande oportunidade para eles ampliarem o conhecimento sobre o comportamento de seus consumidores e, também, para a criação de serviços personalizados e exclusivos, que conversem diretamente com as necessidades de cada público. Ou seja, as empresas que oferecerem melhores experiências, ofertas especializadas e produtos customizados, com certeza poderão sair na frente”, sugere Emanuela Ramos, vice-presidente executiva da Nava Technology, empresa de tecnologia voltada a negócios. 

Emanuela destaca, ainda, que novas parcerias poderão surgir em todo o ecossistema, pois as empresas que não possuem diversificação de produtos terão a oportunidade de firmar convênios e oferecer produtos customizados e novos marketplaces que atendam seus clientes de ponta a ponta, com ofertas competitivas.

E, com a unificação do sistema entre todos os players financeiros, ficará viável a portabilidade do cliente entre uma unidade bancária e outra, fato que, consequentemente, aumentará a competitividade. “A tendência é que haja mais concorrência entre as instituições participantes, que terão que melhorar seus serviços e reduzir taxas para atrair mais clientes”, afirma o especialista em regulação e sócio da JL Rodrigues & Consultores Associados, José Luiz Rodrigues.

A chegada do Open Banking possibilitará também a criação do Iniciador de Transação de Pagamentos. Segundo Marcelo Feltrin, head de desenvolvimento de negócios da Opus Software, empresa de soluções digitais especializada em desenvolvimento de software, a nova modalidade de pagamento permitirá que qualquer empresa, regulada pelo BC, inicie transferências e pagamentos entre o consumidor e o recebedor sem o envolvimento de adquirentes (companhias que efetuam as transações financeiras), bandeiras de cartão e sem a necessidade de abrir o aplicativo do banco para fazer um Pix. 

       Marcelo Feltrin

“Num exemplo prático, ao realizar uma corrida de táxi com um aplicativo tipo Uber, ao final do trajeto, se esse app estiver registrado como um iniciador de pagamento do Open Banking, ele poderá fazer a transferência da conta bancária do usuário para a do motorista, sem a necessidade de um cartão de crédito”, explica Feltrin.  

Na prática

O Open Banking dará autonomia para o cliente construir seu próprio banco, a partir da escolha de serviços financeiros que melhor atendam suas necessidades. “Por exemplo, um cliente que tem conta em um banco A se interessa por um produto do banco B, que é mais vantajoso para ele. Para não ter que abrir uma conta no novo banco, ele simplesmente autoriza essa instituição financeira B a acessar suas informações no banco A, onde é correntista. O consentimento será dado dentro de um ambiente de autenticação do banco onde a pessoa já tem conta”, explica a vice-presidente da Nava Technology.

Quanto ao acesso no Open Banking, o head da Opus Software esclarece que os usuários vão usar interfaces semelhantes às que são utilizadas atualmente para acessar sistemas. “Se hoje o usuário usa, por exemplo, agência, conta e senha para acessar seu Internet Banking, essas mesmas informações serão utilizadas para autorizar o compartilhamento das informações.”

Proteção de dados 

Esse compartilhamento dentro do serviço financeiro ocorrerá por meio de APIs – Application Programming Interfaces (em português, Interface de Programação de Aplicação), criadas a partir de padrões de programação que permitem a comunicação de dados de uma fonte a outra. “Uma das características do Open Banking é a utilização de padrões de segurança extremamente avançados. As tecnologias adotadas estão entre as mais sofisticadas disponíveis na indústria”, enfatiza Feltrin.

               José Luiz Rodrigues

Para garantir a proteção dos dados dos usuários, o Open Banking será totalmente alinhado às disposições da Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD, no propósito de certificar a segurança das informações. “A LGPD trará ao Open Banking mais segurança, tanto para o consumidor quanto para as instituições, que terão que estar em conformidade com as regras, a fim de evitar litígios”, explana Rodrigues.

E como a participação no Open Banking é restrita às instituições reguladas pelo Banco Central, todos os participantes já seguem regras de segurança preestabelecidas. “O sistema financeiro brasileiro é um dos mais seguros do mundo e já trabalha com rígidos padrões quanto à proteção de dados”, afirma Doherty.

Vale mencionar, entretanto, que a segurança de dados vai além de todo o investimento que o ecossistema financeiro se propõe a executar. “Quando surgem novos produtos e serviços, também aparecem novas fraudes. Já há golpes circulando nas redes e  diversas pessoas caindo em armadilhas com o Pix, lançado recentemente. Por isso, é fundamental a conscientização da população para que as pessoas sejam cada vez menos alvo desses golpes rotineiros”, alerta Emanuela.

Ameaça ou oportunidade para as instituições?

Na opinião do superintendente da ANBIMA, o Open Banking, sem dúvida, é uma oportunidade. Ele embasa seu ponto de vista no modo como o cliente vem se relacionando com o mercado, além da chegada de um público cada vez mais jovem, ligado à tecnologia e interações virtuais. “O Open Banking é uma chance para melhorar o relacionamento com o cliente, desenvolvendo produtos mais rapidamente de acordo com a sua necessidade. Além disso, o sistema oferece às instituições maior capacidade de análise, permitindo decisões baseadas em dados e abre oportunidades de criação de novos serviços a partir de parcerias com fintechs, por exemplo. Então, vejo mais oportunidades que ameaças”, conclui.




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