Empreendedorismo e Administração: a combinação perfeita - CRA-SP
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Empreendedorismo e Administração: a combinação perfeita

Seis a cada dez brasileiros sonham em empreender, no entanto, muitos não têm o conhecimento necessário para gerir o negócio, que acaba fechando as portas. Atuação do administrador é fundamental para mudar esse cenário

O desejo de ter o próprio negócio é o segundo sonho mais citado pelos brasileiros, ficando atrás, apenas, da vontade de viajar pelo Brasil. Há, também, um elevado número da população (53% dos adultos ou 51,5 milhões de pessoas) que ainda não empreende, mas que já manifestou interesse em iniciar uma atividade empreendedora nos próximos três anos, conforme aponta o relatório Global Entrepreneurship Monitor (GEM) 2022, realizado pela Associação Nacional de Estudos em Empreendedorismo e Gestão de Pequenas Empresas (Anegepe) e pelo Sebrae. Nesta edição, foram entrevistados 2.000 brasileiros adultos e 52 especialistas.

Entre as principais razões que motivam as pessoas a abrir uma empresa, segundo a pesquisa, estão a escassez de emprego (82%), a vontade de fazer a diferença no mundo (75%), a intenção de construir riqueza (64%) e o objetivo de continuar uma tradição familiar (44%). 

Embora grande parcela dos brasileiros viva a expectativa de empreender e, assim, conquistar sua independência profissional, a realidade, no entanto, mostra que não é tão simples pôr o plano em prática. O GEM 2022 revelou um ligeiro aumento no percentual de brasileiros que descontinuaram algum negócio, em comparação a 2021, chegando a 10% entre os empreendedores nascentes (aqueles em criação ou com até três meses de atividade).

Foto de Paulo Sergio Franzosi

Paulo Sergio Franzosi

Outro levantamento realizado pelo Sebrae em 2021, a partir das bases de dados da Receita Federal e de pesquisas de campo, mostrou que a taxa de mortalidade das empresas no País segue em alta. O microempreendedor individual (MEI) é o que apresenta o maior percentual de fechamento de negócios em até cinco anos, chegando a 37%. Nas microempresas (MEs) o encerramento atingiu 18% e, nas de pequeno porte (EPP), 13%, durante o mesmo período.

Ao analisar as causas da descontinuidade dos negócios, o GEM pontua que, em 2020 e 2021, a pandemia foi o principal fator. Embora a Covid-19 tenha trazido muita gente nova para o empreendedorismo, uma parte significativa não conseguiu se manter na atividade justamente por conta dela. “Muitos empreendedores tiveram dificuldades em obter crédito para manter o capital de giro, o que ocasionou o fechamento da empresa”, explica o gerente regional do Sebrae-SP, Paulo Sergio Franzosi.

Como nesse período houve um número considerável de negócios criados pela necessidade, Franzosi conta, também, que muitos desses empreendedores não possuíam experiência no ramo de atuação e nem conhecimento sobre gestão de negócio, o que culminou no encerramento das atividades. 

Dificuldades administrativas

O desafio de administrar uma empresa reside no fato de que essa é uma tarefa complexa, conforme menciona o Adm. Jefferson Freitas de Oliveira, coordenador do Grupo de Excelência em Empreendedorismo e Inovação - GEEI, do CRA-SP. Ele cita que, atualmente, diante do aumento na velocidade em que as mudanças ocorrem, muitas organizações são incapazes de se adaptar, o que gera impactos profundos, como o fechamento.

Entre os principais erros cometidos na administração dos negócios, de acordo com o coordenador do Núcleo de Inovação e Empreendedorismo da ESPM Rio, Ney Cavalcante, está a falta de informações sobre gestão financeira, que, para ele, é um dos pontos primordiais para o sucesso da empresa. “Se o empreendedor não tiver conhecimentos adequados e profundos na área, fica mais difícil. Um fluxo de caixa, por exemplo, vai ser mais complexo do que realmente é”, explica o docente.

Outro fator que ele menciona é a gestão dos processos, afinal, se o empreendedor tem dificuldade de identificar e administrar seus principais processos, isso pode resultar em perda financeira e de carteira de clientes. Além disso, há também a dificuldade de se diferenciar da concorrência e de se estabelecer no mercado. 

“Ele precisa mostrar que tem um branding, uma marca e, para isso, não basta só ter um produto ou um serviço que funcione, é preciso fazer um planejamento bem feito e ter um pouco do fator sorte. É muito importante conhecer bem os concorrentes, mas aí há um paradoxo, porque o pequeno empreendedor não tem tempo suficiente para pensar em estratégias, uma vez que precisa fazer todos os outros processos. Ele fica preocupado só em vender, mas o que o concorrente está fazendo? O mundo está cada vez mais sem fronteira, por isso é necessário entender as mudanças que estão acontecendo no seu mercado. Um exemplo são essas empresas chinesas entrando no Brasil, como a Shein, que tem um centro de reposição poderoso. Para o negócio sobreviver, não tem como não entender de economia global ou não saber o que a China está fazendo”, comenta o docente.  

Além da inexperiência na gestão e do pouco preparo do empreendedor na elaboração de um plano eficiente, outros entraves também podem comprometer a sobrevivência de uma empresa, de acordo com o gerente do Sebrae. Ele pontua, como exemplos, as elevadas taxas de imposto; a burocracia, tanto para a abertura quanto para a manutenção das organizações; e o acesso ao crédito, que além de escasso, especialmente para micro e pequenas empresas, possui juros altos.

Para o coordenador da ESPM, os brasileiros mantêm uma visão errada sobre empreendedorismo, pois eles pensam que vão ganhar muito dinheiro e trabalhar menos, sendo que, na verdade, trabalha-se muito mais. “A gente se remunera por último, por conta da carga de burocracia e impostos. As micro e pequenas empresas estão expostas a essa situação e, ainda, têm que escolher o regime tributário. Por conta de tudo isso começa a aparecer um alto índice de inadimplência nos pequenos negócios”, complementa Cavalcante.

Apoio profissional

Embora o cenário empreendedor seja complexo de administrar, um levantamento do Sebrae deixa claro que o pequeno empresário, além de não abrir mão do sonho de ter o seu próprio negócio, ainda gera emprego. O estudo revelou que 76% dos postos de trabalho criados em abril deste ano foram gerados pelas micro e pequenas empresas. “O setor de serviços foi a principal força motora de empregos do País, apresentando um total de 69,4 mil novas vagas, ou seja, seis a cada dez novos postos. Os micro e pequenos negócios demonstram a sua importância e relevância para a redução do desemprego no País, impulsionando 1,9% do Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro trimestre de 2023”, conta Franzosi.

E como não é força de vontade que falta, mas sim conhecimento, os empreendedores podem suprir essa lacuna por meio da formação em Administração, bem como contar com as habilidades e competências dos profissionais da área na gestão de sua empresa.

O coordenador do GEEI explica que a multidisciplinaridade que o curso proporciona permite identificar oportunidades de inovação e implementar novas tecnologias e práticas no negócio. “A aquisição dessas competências poderia se dar por meio da formação do empreendedor em Administração. No entanto, dado o tempo necessário e a velocidade de crescimento esperado pelas empresas, algumas vezes isso se torna inviável. Nestes casos, a entrada de novos colaboradores se faz mandatória para desenvolver áreas específicas e a busca por bons administradores pode fazer a diferença”, afirma Oliveira.

Ele lembra que o profissional com boa formação pode realizar análises de posições estratégicas, avaliar o ambiente de negócios e identificar tendências, facilitando a tomada de decisão direcionada ao crescimento da empresa. “Habilidades ligadas à boa gestão financeira, com o uso de indicadores pautados no fluxo de caixa, na análise de custos e de investimentos, e na lucratividade esperada propiciam decisões econômicas e financeiramente sustentáveis no curto prazo, como também as relacionadas à melhor precificação, valorização e sobrevivência da empresa ao longo dos anos”, esclarece.

Além disso, Oliveira explica que o profissional da área também pode ajudar no posicionamento da marca no mercado em razão de suas competências em marketing, que o habilitam na identificação do público-alvo, na formação de estratégias de crescimento e desenvolvimento, bem como na utilização eficiente de canais de mercado. 

Outro ponto é o apoio em relação à gestão de recursos humanos. O coordenador alega que o profissional pode atuar na identificação, recrutamento, treinamento e desenvolvimento adequado dos colaboradores, além de ajudar na manutenção de um ambiente de trabalho colaborativo, no qual a comunicação seja ágil e eficaz. “A contratação de colaboradores com habilidades, atitudes e conhecimentos apropriados pode auxiliar as empresas no aumento de sua capacidade de adaptação às mudanças”, complementa Oliveira.

Foto de Ney Cavalcante

      Ney Cavalcante

Ferramentas e métodos de gestão

Para ampliar a produtividade e a competitividade dos negócios, os administradores fazem uso de ferramentas e métodos de gestão. No entanto, antes de definir qual deles será aplicado no empreendimento, Oliveira sugere analisar o porte da empresa, o estágio de crescimento e desenvolvimento, a área de atuação, a cultura e os valores organizacionais, os desafios internos e externos, a estratégia organizacional, a estrutura, entre outros aspectos.

Feitas essas considerações, o próximo passo é traçar um plano de negócios. Segundo o professor da ESPM Rio, é isso que vai detalhar os objetivos do empreendimento e dizer o que fazer para chegar lá. “O plano é uma forma de arrumar a casa. Ele pode orientar, mas não adianta fazer e colocá-lo na gaveta”, alerta.

Partindo disso, os administradores recorrem a recursos como: análise SWOT (identifica as forças, fraquezas, oportunidades e ameaças de uma empresa ou produtos); matriz BCG (analisa o desempenho dos produtos e serviços); PDCA (gestão de quatro passos, que controla processos e produtos); 5 Porquês (auxilia a gestão de qualidade e otimização de processos); gestão enxuta (evita desperdício, seja de tempo ou processos); gestão de projetos agile (usa metodologias ágeis); project model canvas (gerencia projetos); e KPI (mede o nível de desempenho e sucesso da empresa ou processo). 

“Essas ferramentas e métodos de gestão, entre muitas outras disponíveis no arsenal de trabalho do administrador, se estabelecem como exemplos interessantes da tarefa contínua pela busca de benchmarking, padrão ou ponto de referência para as melhores práticas em Administração, no sentido de ganhar vantagens competitivas”, afirma Oliveira. 

A aplicação desses recursos, no entanto, requer um conjunto de competências que envolvem a junção de conhecimento e a capacidade cognitiva, responsáveis pela adaptação às diversas situações e ambientes. Para tanto, os administradores podem se aprimorar a partir de especializações voltadas ao setor. Segundo o coordenador da ESPM Rio, eles podem buscar por pós-graduações em gestão de negócios, de projetos, empresarial ou, ainda, se especializar em empreendedorismo e inovação, em supply chain, entre outras formações. “É importante, primeiro, saber se o curso é relevante, se tem infraestrutura adequada e se vai aumentar seu network”, orienta Cavalcante.

Como inovar sem recursos?

No início de um novo empreendimento é comum que as empresas de pequeno porte não disponham de dinheiro e tampouco de mão de obra para o desenvolvimento do negócio. Nesse dilema, a pergunta de milhões que surge é: como inovar com recursos limitados?

Um dos caminhos, segundo o coordenador da ESPM Rio, é ampliar o relacionamento. “Quanto mais pessoas eu conhecer e colaborar, mais ajuda terei”, orienta. Outro ponto que ele considera fundamental é treinar a equipe e, ainda, entender como a ferramenta utilizada pode aumentar a eficiência. 

Uma vantagem que ele vê em relação à empresa de grande porte é que o pequeno empreendimento pode ter um ambiente propício para a criatividade, que seja mais descontraído e menos robótico e repetitivo, o que é geralmente mantido pelas organizações maiores. Para se diferenciar, no entanto, não tem jeito: é preciso pensar em inovação. Para aprimorar os produtos e serviços, bem como melhorar os processos e fluxos, Cavalcante diz que o empreendedor pode recorrer muito mais à criatividade do que ao investimento financeiro.

Por último, o docente recomenda que ele esteja aberto a novas parcerias. “O empreendedor pode fazer um escambo se a concorrência for enorme, o fluxo de caixa não for grande ou não houver investimento em marketing. Por exemplo: sou bom na parte financeira e próximo a mim tem uma empresa que faz mídia digital. Neste caso, podemos trocar as habilidades. A busca por parceiros vai dar um respiro para que ele possa focar naquilo que sabe", sugere.

Foto de Roberto Carlos Nogueira

Roberto Carlos Nogueira

Jornada empreendedora

“Cada desafio vencido traz uma sensação muito boa”. É assim que o empreendedor e representante institucional do CRA-SP, Adm. Roberto Carlos Nogueira, define sua jornada ao abrir o próprio negócio. Ao longo de sua trajetória profissional, ele teve a oportunidade de trabalhar em organizações que permitiam o exercício do empreendedorismo. Com o tempo, Nogueira quis aplicar toda a competência adquirida como CLT em sua empresa, que foca no desenvolvimento humano e empresarial. Neste ano, a Prosperiza completou 10 anos. “Apesar das  instabilidades da última década, conseguimos crescer e hoje atuamos no mercado nacional e internacional”, conta o empreendedor. 

Ele relembra que o maior desafio foi não ter amplo conhecimento da área fiscal e dos aspectos burocráticos que envolvem a abertura de uma empresa. “Para não ter problemas, já na largada do negócio procurei um bom contador que resolveu todas as burocracias”, revela.

Por outro lado, Nogueira diz que a sua formação lhe proporcionou uma visão sistêmica. “Essa é a maior vantagem de quem cursa Administração. E quando precisar de algo que não domina, contrate uma empresa ou um profissional que possua as competências que necessita”, sugere o empreendedor. 

Foto de Carolina Vargas

       Carolina Vargas

Outro caso de empreendedorismo que vale destaque é a história de Carolina Vargas, também representante institucional do Conselho. Apaixonada por TV, ela iniciou a carreira em um estágio na Directv América Latina. Visando atender às constantes mudanças pelo qual o setor passava, na rapidez de resposta que esse mercado exigia, decidiu empreender e fundou a Stenna, empresa líder no segmento de distribuição audiovisual no Brasil, que em fevereiro de 2024 completará 10 anos.

A CEO, no entanto, revela dificuldade no processo de desenvolver pessoas e mantê-las motivadas. “O crescimento da empresa sempre é algo doloroso, pois ninguém nasce sabendo empreender. Por mais que exista a possibilidade de estudar os temas, viver o empreendedorismo é algo totalmente diferente”, diz. 

Embora atue em um mercado predominantemente masculino, Carolina diz que quando há conhecimento, ninguém discute. “Busquei entender amplamente o mercado e a dinâmica do negócio para poder falar com propriedade sobre os temas que trabalhamos”, explica.

O sucesso nos negócios, segundo a CEO, vem para o empreendedor persistente, que acredita na sua intuição e é humilde para aprender com cada erro. “Saber se posicionar sobre o que você está empreendendo é uma das coisas mais importantes para manter a caminhada. Nenhuma tarefa é fácil e a busca constante para manter a mente equilibrada é uma ferramenta que todos deveríamos buscar”, conclui. 

Dicas para empreender

Se você, leitor, assim como a maioria dos brasileiros, tem o sonho de empreender, vale atentar aos conselhos do gerente regional do Sebrae SP, Paulo Sergio Franzosi. Ele orienta, antes de tudo, a buscar informações, ser cauteloso nas decisões, analisar a viabilidade do negócio e, principalmente, fazer um bom plano de negócios. Para ficar ainda mais claro, confira abaixo 10 dicas objetivas:

1 - Escolha um ramo de atividade que você se identifica; 

2 - Tenha foco no cliente - identifique seu persona;

3 - Defina muito bem seu propósito e o valor que quer entregar;

4 - Saiba delegar responsabilidades;

5 - Seja inovador e criativo;

6 - Faça a gestão e controle das finanças;

7 - Construa parcerias fortes;

8 - Invista na presença digital e seja relevante;

9 - Trabalhe o engajamento de sua equipe;

10 - Recicle e atualize os conhecimentos.




Revista Administrador Profissional - ADM PRO
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