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A vez do metaverso

Como as empresas estão se preparando para essa nova tendência imersiva de fazer negócios 

Aproximar as pessoas em um mundo virtual, por meio de plataformas 3D que proporcionam experiências nas quais não há diferença entre o universo digital e o real: essa é a proposta do metaverso. 

O novo ambiente reúne diversos elementos tecnológicos, como a realidade virtual (VR), a realidade aumentada (AR), o blockchain (sistema que permite rastrear o envio e recebimento de alguns tipos de informação pela internet), as criptomoedas e os NFTs (tokens não fungíveis, em português). Neste mundo paralelo as pessoas se socializam, se divertem, aprendem, consomem e fazem negócios por meio de seus avatares (bonecos virtuais customizados), em um ambiente imersivo que se assemelha ao mundo real.

As pessoas estão cada vez mais investindo tempo nessas interações. Vamos expandir de uma interação que hoje só existe no aplicativo do celular, que tem uma certa limitação de experiência e de tamanho de tela, para uma vivência com novos hardwares e plataformas, de forma que você sinta que realmente está com outra pessoa numa interação muito próxima comparada ao nível presencial, com sentimentos e sensações”, explica Fernando Godoy, CEO da Flex Interativa, empresa de desenvolvimento de soluções em realidade virtual, aumentada e metaverso.

O termo ganhou destaque no final de 2021, quando o CEO do Facebook, Mark Zuckerberg, anunciou a mudança do nome da empresa para Meta, como nova identidade corporativa do grupo, dando início a uma nova fase na multinacional, que pretende se tornar uma empresa de metaverso em até cinco anos. Para isso, foram investidos, apenas no ano passado, cerca de US$ 10 bilhões. 

Embora tenha se tornado a palavra do momento, o conceito surgiu pela primeira vez em 1992, no livro de ficção científica Snow Crash, do escritor Neal Stephenson. Na história, o metaverso é um mundo virtual em 3D em que as pessoas usam a realidade virtual para interagir dentro de um ambiente de tecnologia semelhante a um jogo.

Por mais que pareça ser algo distante de nossa realidade, a imersão em um mundo virtual que tenta replicar a realidade em dispositivos digitais já existe há algum tempo nos videogames. “O espaço coletivo e virtual compartilhado faz parte de alguns jogos como VRChat, Roblox e Second Life, este último lançado em 2003. Um mundo virtual como Fortnite, que pode ser acessado por um computador, pelo console de videogame ou pelo telefone, também pode ser considerado um metaverso. Já no World of Warcraft, os jogadores podem comprar e vender itens e mercadorias.  Isso nos leva a observar o aspecto econômico, pois os usuários criam, compram e vendem produtos”, esclarece Maurício Conti, engenheiro de computação, CPO na wconnect e influenciador digital nas áreas de blockchain e NFT.

E, por falar em economia, esse é um dos motivos pelo qual há tantas empresas se movimentando em relação a esta nova forma de fazer negócio. O metaverso é um mercado que tende a alcançar bilhões de dólares, embora não exista um consenso a respeito. O site The Information, que cobre o Vale do Silício, estima que este mercado pode representar uma receita em torno de US$ 85 bilhões de dólares, em 2025. No entanto, a consultoria Emergen Research é bem mais otimista: para ela este será um mercado de US$ 829 bilhões, em 2028.

Para se ter uma dimensão de como os negócios que envolvem o metaverso são rentáveis, em novembro passado um terreno virtual foi vendido por US$ 2,4 milhões (aproximadamente R$ 13,5 milhões) no metaverso Decentraland. O valor é mais alto do que o preço médio de uma casa em Manhattan, em Nova York, ou seja, o custo de propriedades digitais, em alguns casos, está mais alto do que as do mundo real. Outro exemplo é um modelo de iate virtual criado para o jogo The Sandbox, que foi leiloado por R$ 3,6 milhões e se tornou o NFT mais caro do jogo.

O mundo da moda também vem chamando a atenção no universo digital. Uma bolsa da Gucci, do modelo Gucci Dionysus, foi vendida no ambiente metaverso por R$ 21.857, superando o valor da peça real, que no tamanho super mini custa R$ 4.450 e, no pequeno, R$ 12.970.

“Muitos acreditam que esta tecnologia será a próxima que vai mudar o mundo, assim como foram os PCs na década de 80, a internet nos anos 90, as redes sociais nos anos 2000 e as criptomoedas e NFTs nos últimos anos”, diz Conti.

O futuro da internet

O metaverso vem sendo definido como o futuro da internet e com ele, um novo termo tem surgido: a Web 3.0. Para entender esta nova versão, vale relembrar as anteriores. A Web 1.0 é conhecida como a era da internet discada e com páginas estáticas. “Os sites tinham muitas informações e notícias. As imagens eram totalmente fora de padrão, ocupavam quase que a página inteira e os vídeos, para não dizer que não existiam, eram pesados e sem qualidade”, recorda Conti.

Já no início do século 21 tivemos a Web 2.0, moderna, dinâmica e voltada aos usuários. Com ela, os problemas de imagens e vídeos da era anterior foram superados. “A tecnologia evoluiu tão rapidamente neste quesito que agora falamos em lives, transmissões ao vivo, alta resolução, qualidade de áudio e vídeos perfeitos etc. Mas há uma razão em especial para a atualização em uma nova versão: a descentralização”, complementa o especialista. 

A Web 3.0 é descentralizada, isto é, a plataforma garante que não haja um controle de poder, como acontece atualmente com as big techs, como Google e Meta. Dessa forma, os dados são dos próprios usuários e há navegadores que permitem que eles sejam recompensados financeiramente com criptomoedas, caso queiram compartilhar essas informações. 

  Élcio Brito

“A Web 3.0 trata de uma mudança de arquitetura da web, que pode trazer grandes disrupções para o mercado. Teoricamente, ela tentará ser mais democrática. A ferramenta principal para isso será a distribuição dos dados sem a perda da integridade da informação, o que hoje começa a ser possível com a tecnologia do blockchain. A Web 3.0 terá uma trajetória paralela à do metaverso, com intersecções entre ambos”, explica Elcio Brito, cofundador e sócio-diretor da SPI Integração de Sistemas, empresa de engenharia com 30 anos de mercado.

Além disso, a nova versão da internet permite criar qualquer tipo de experiência que a pessoa queira ter. “Existem startups desenvolvendo o cheiro para a Web 3.0 por meio de um dispositivo acoplado no computador ou em óculos VR, onde as fragrâncias vão sendo liberadas. Isso torna a experiência mais realista”, exemplifica Godoy, da Flex Interativa. 

Impacto nos negócios

Este novo mundo virtual irá impactar todos os setores, contudo, na área de tecnologia isso será ainda maior. “O metaverso seguramente é a melhor expressão, em termos de negócio, do que significa um ‘oceano azul’ desde a criação da internet, desde que seu significado não seja limitado apenas às experiências que XR (realidade estendida), IoT (internet das coisas), 5G e blockchain podem gerar”, comenta Brito.

A Hyundai, por exemplo, não restringiu o metaverso a uma gamificação e aproveitou o interesse pelo tema e a aquisição da Boston Dynamics (empresa dos EUA de engenharia robótica) para lançar o conceito Metamobility, no qual a experiência do usuário, combinada à robótica, irá desafiar os produtos, os modelos de negócio e os processos produtivos das empresas de mobilidade desenvolvidos atualmente.

Já a Microsoft investiu pesado em realidade virtual com a compra da Activision Blizzard, dona dos jogos Call of Duty e o World of Warcraft, por US$ 68,7 bilhões. “Eles se somam ao portfólio da Microsoft, como o Doom (comprado em 2014 por US$ 2,5 bilhões) e Minecraft (comprado em 2020 por US$ 7,5 bilhões)”, explica Conti. 

E, como não poderia deixar de ser, ela já desenvolveu seu próprio metaverso: o Mesh. A partir deste ano, a Microsoft pretende adotar recursos como realidade aumentada e virtual que serão aplicadas ao Teams, permitindo, assim, que os usuários participem de reuniões virtuais com avatares 3D. Para isso, nem será preciso utilizar óculos e controles de VR: a tecnologia deve funcionar em smartphones e computadores. No Mesh, as organizações vão poder criar seus próprios metaversos e os funcionários poderão interagir em um ambiente virtual.

Outro exemplo de empresa que também está de olho na nova tendência do mercado é a TIM. No final de janeiro, ela lançou uma loja conceito no Barra Shopping, no Rio de Janeiro, e na inauguração criou a MetaLoja, um espaço onde a experiência física e as possibilidades do metaverso se misturaram.

O metaverso também chegou na Nike NYC, loja física em Nova York. No mês de janeiro, o espaço ofereceu aos clientes a experiência da Nikeland, mundo virtual que a marca tem no Roblox (universo virtual que permite que você crie e compartilhe experiências). Os visitantes puderam criar seus próprios mundos e avatares vestidos com produtos da Nike, por meio de realidade aumentada (tecnologia usada no jogo Pokémon GO). 

Transformações no dia a dia

O novo universo de interatividade também está levando as lideranças das grandes empresas e startups a pensarem qual modelo de trabalho eles deverão seguir no pós-pandemia: presencial, remoto ou híbrido. O CEO da Flex Interativa aposta no modelo híbrido. “Se vou para um treinamento, um workshop ou mesmo uma viagem, posso ter uma experiência com o metaverso antes de conhecer o destino ou um determinado hotel. Eles podem disponibilizar uma versão 3D onde vou conhecer as experiências que terei no local físico. Isso já começa a impactar o negócio, porque posso decidir ir viajar ou não, porque se quero conhecer o Louvre, por exemplo, posso ter essa experiência em casa. Isso não necessariamente vai reduzir a presença das pessoas, mas pode gerar uma nova receita, uma vez que antes o ingresso era vendido apenas para quem ia presencialmente à galeria de arte e, agora, estará disponível para o mundo todo, num ticket menor, mas com um maior número de pessoas participantes”, comenta Godoy.

  Fernando Godoy

O impacto também movimenta o ambiente educacional, já que é possível montar a escola no metaverso e criar uma experiência diferente sem a necessidade de alugar um imóvel, comprar mesa, cadeira ou projetores. “Crio um ambiente bacana e atendo um público muito maior, pois agora posso ter pessoas de todo o Brasil. O valor a ser cobrado, e que era mais caro no presencial, fica mais barato, mas tenho um maior número de pessoas participando”, complementa Godoy.

O setor da indústria é outro que pode se beneficiar, afinal, é possível criar experiências que vão desde aperfeiçoar o desenvolvimento do trabalho da equipe de produção, até gerar uma rede colaborativa onde um engenheiro no Brasil e outro na Alemanha, por exemplo, interagem e constroem produtos em tempo real. 

“Para o varejo também há muitos benefícios. Imagina quanto custa alugar uma loja em um shopping? E porque não criar a própria loja ou entrar no metaverso específico de varejo e ter lá meu atendente pronto para tirar as dúvidas dos avatares (clientes) que entrarem nesse ambiente”, sugere Godoy.

Na opinião do cofundador da SPI, o metaverso impacta tanto o B2C quanto o B2B. “Tornar on-line o que era offline tem o potencial não apenas de criar experiências, mas também de contribuir para a produtividade, a sustentabilidade e várias outras demandas individuais e coletivas da humanidade. Do ponto de vista dos negócios, a pergunta mais importante que surge é: quando será a minha vez? Saber quando uma empresa será impactada e se antecipar à transformação é, possivelmente, o principal desafio de qualquer CEO atualmente”, argumenta Brito.

Como se preparar para o novo modelo de negócio?

Segundo especialistas, uma das primeiras coisas que uma empresa deve fazer é se aprofundar, buscar conhecimento, ver cases de organizações concorrentes para saber como elas estão aplicando a tecnologia e utilizar o metaverso a favor do seu negócio. “As empresas que entrarem no metaverso como fornecedoras ou compradoras têm que estar lá para aprender, para expor seus produtos e serviços e, principalmente, para melhorar a experiência entre marca-cliente-consumidor. Para isso, devem promover eventos, expor seus produtos em 3D e, assim, os clientes com seus avatares entrarão no metaverso da sua marca e verão as características da mercadoria, quem já comprou ou recomendou o produto. Com isso, terão uma experiência totalmente diferente”, orienta o fundador da Flex Interativa. 

Além de expandir os negócios dos diferentes setores, o lançamento do metaverso irá ampliar também as oportunidades no mercado de trabalho, em razão das novas demandas que vão surgir. Segundo um estudo da Brasscom - Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) e de Tecnologias Digitais, até 2025 cerca de 800 mil novas vagas na área de TI devem ser criadas, além de novas profissões bastante promissoras. No entanto, a Associação prevê um déficit de 103 mil profissionais de tecnologia entre 2022 e 2025, ou seja, muitas vagas ficarão em aberto por falta de profissionais qualificados para ocupá-las. 

                                                            Mauricio Conti

“Vale destacar que esse setor costuma pagar pelo menos três vezes mais do que a média salarial do brasileiro em outras áreas da economia”, lembra Conti. Para ele, algumas dessas novas e promissoras funções voltadas às "metaprofissões" e "blockcarreiras" são: arquiteto de sistemas blockchain, segurança de metaverso, construtor de 3D para metaverso, consultor blockchain para negócios e gestor de fundos tokenizados/criptoativos. 

De tudo o que já foi visto até agora em relação ao metaverso, a única coisa que se pode afirmar é que essa nova fronteira de conexão social não tem limites. Praticamente tudo poderá ser feito virtualmente. Entretanto, ainda vai levar um tempo para que ele faça parte do nosso dia a dia, pois muitas tecnologias necessárias para o desenvolvimento completo e funcional do metaverso ainda precisam ser aperfeiçoadas. O próprio Zuckerberg afirmou, na live de apresentação da Meta, que isso pode acontecer nos próximos cinco ou dez anos.

Mas o fato é que a revolução tecnológica já começou. “Talvez seja o momento de as empresas que ainda não possuem especialistas em tecnologia com olhares treinados para acompanhar a evolução das diferentes mudanças que estamos vivenciando, sejam tecnológicas ou comportamentais, procurarem por uma consultoria para aproveitar as oportunidades deste novo mundo que começamos a conhecer”, conclui o sócio-diretor da SPI.

O que é NFT?

Os NFTs, sigla em inglês para Non Fungible Token (em português, token não fungível) são tokens criptográficos, isto é, códigos numéricos que autenticam as transações de todos os itens dentro do metaverso e garantem ao seu dono que aquela obra digital é única.

O sistema que garante a segurança e validade das transações do NFT é o blockchain. Os NFTs utilizam a rede de criptomoeda Ethereum (ETH) para emitir e armazenar o certificado digital e, com isso, só é possível comprar ou vender NFT por meio dessa plataforma.

Para entender melhor a diferença entre o token fungível e o não fungível, basta saber que os ativos fungíveis, de acordo com o Código Civil Brasileiro, são aqueles “que podem substituir-se por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade”. Exemplo: se você tem uma nota de R$ 200 e quer trocá-la por duas de R$ 100, isso é possível, pois ela é fungível. Já o token não fungível significa que o produto não pode ser substituído, pois tem sua particularidade, especificidade e exclusividade. Pense que você comprou o NFT de uma obra de arte digital feita por um artista renomado. Ela é não fungível, pois é única e não pode ser trocada por outra igual.

Por ser um mundo completamente novo, muitos questionam o motivo de as pessoas desejarem ser donas de uma obra digital, já que ela pode ser baixada pela internet. A questão é que só os compradores podem ter o status de dono da obra. “O NFT viabiliza o conceito de escassez para ativos digitais”, explica o cofundador da SPI, Elcio Brito.

No fim do mês de janeiro, por exemplo, o jogador Neymar Jr. investiu cerca de 350 ETH, o equivalente a R$ 6,2 milhões, em dois NFTs da coleção Bored Ape Yacht Club (BAYC), uma das mais populares e valiosas do mercado. O atleta escolheu as artes digitais dos macacos entediados. Uma semana depois, o cantor canadense Justin Bieber comprou o primo do macaco, um chimpanzé, por quase R$ 7 milhões.

Isso comprova como os NFTs também são um mercado bilionário. De acordo com os dados do site de análises DappRadar, entre janeiro e setembro de 2021, o volume de vendas desses tokens chegou a US$ 13,2 bilhões.  

Como adquirir um NFT?

Segundo Mauricio Conti, CPO na wconnect, existem dezenas de marketplaces, sendo o mais famoso deles o OpenSea, onde se pode comprar os NFTs usando alguma criptomoeda. “A mais comum para este uso é a Ethereum (ETH), mas também são usadas outras, como a Solana”, explica.

Assim como qualquer investimento, o NFT também tem seus riscos e, neste caso, o maior deles é a desvalorização. “Você pode comprar um token com um valor muito alto e depois, ao tentar vender, não conseguir lucrar”, comenta Conti.

Além de adquirir um ativo digital, qualquer pessoa também pode criar e vender um NFT. Eles podem ser qualquer tipo de item, seja ele digital ou físico. Entre as opções, as mais comuns são voltadas às obras de arte, no entanto, músicas, itens de jogos, momentos únicos no esporte, cards digitais colecionáveis, terrenos virtuais e até memes podem ser transformados em um NFT.




Revista Administrador Profissional - ADM PRO
Publicação física com periodicidade trimestral
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