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Etarismo: velho conhecido dos profissionais seniores

Pesquisa revela que um em cada quatro profissionais já foi demitido por conta da idade. Para mudar esse cenário, especialistas dão dicas sobre como promover a diversidade geracional nas organizações e mostram os caminhos para a recolocação no mercado

Em 2018, o Brasil ultrapassou a marca de 54,8 milhões de pessoas com mais de 50 anos, segundo o site Longevidade. Outros 28 milhões de brasileiros têm acima dos 60 anos, o que representa 13% da população do País. A expectativa, no entanto, é que esse número dobre nas próximas décadas, conforme as projeções divulgadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), que apontam que, até 2030, o número de idosos deve superar o de jovens de até 14 anos. E, em 2050, o Brasil deve ser o sexto país com a maior população idosa do mundo.

Com o aumento da longevidade esperava-se que a trajetória no mercado de trabalho também se prolongasse, porém dados mostram que as empresas não estão preparadas para absorver a força de trabalho dos profissionais mais experientes. Um exemplo disso é a pesquisa Etarismo, realizada pela empresas Vagas.com, Colettivo e Talento Sênior em agosto de 2022, com a participação de 252 profissionais de Recursos Humanos, que revela que um a cada quatro profissionais já foi demitido por conta da idade. 

O levantamento mostra, ainda, que 24% dos trabalhadores de 30 a 39 anos já sofreram algum tipo de discriminação no ambiente de trabalho em função da idade. “Isso evidencia que o preconceito etário não está mais restrito apenas a quem tem 40 anos ou mais”, explica Cris Sabbag, CDO (Chief Diversity Officer) da Talento Sênior, empresa que colabora com a inclusão de profissionais 45+ no mercado de trabalho.

Foto de Fran Winandy

Fran Winandy

Cultura etarista

O etarismo, também conhecido como ageismo, consiste no preconceito, intolerância e discriminação contra pessoas com idade avançada e ainda paira  fortemente na sociedade, resultando em reflexos dentro das organizações. “O Brasil sempre foi considerado um ‘país jovem’ e esse mindset ainda existe hoje em dia, embora não seja mais uma realidade, já que um quarto da população tem mais de 50 anos”, explica Fran Winandy, palestrante e consultora na área de Diversidade Etária e autora do livro "Etarismo, um novo nome para um velho preconceito".

Os estereótipos negativos relacionados ao envelhecimento, muitas vezes até inconscientes, acentuaram esse tipo de preconceito e invalidaram a experiência e contribuições que os idosos poderiam agregar aos negócios. Afinal, não é raro ouvir que as pessoas mais velhas são desatualizadas, lentas, teimosas, e que não são abertas a mudanças ou que têm dificuldades de aprendizado, principalmente no que tange a tecnologia. “É uma visão desatualizada, míope e errada, porque ela generaliza. Hoje em dia, tem muita gente 50+ atualizada, ativa, aberta à mudança e conectada. A questão é que as pessoas ainda generalizam, estereotipam e perpetuam o preconceito”, explica Mórris Litvak, CEO e fundador da Maturi, empresa que conecta pessoas acima de 50 anos a oportunidades de trabalho, networking e desenvolvimento pessoal e profissional.

Outro entrave que dificulta o ingresso de profissionais mais seniores nas empresas é a falta de conhecimento dos recrutadores sobre etarismo. Dos 252 profissionais de RH que participaram da pesquisa da Vagas.com, 58% afirmaram não ter domínio suficiente do assunto para recrutar esse público. “A pesquisa trouxe também que 55% dos respondentes já tiveram que convencer o gestor ou alguém da equipe sobre a importância de contratar uma pessoa mais velha”, conta Cris, da Talento Sênior. 

Foto de Cris Sabbag

       Cris Sabbag

Como promover a diversidade geracional 

Para a consultora Fran, os esforços que visam eliminar o cenário de preconceito no ambiente organizacional ainda são pálidos frente aos avanços da longevidade no Brasil e no mundo. Ela reforça que a promoção da diversidade geracional nas empresas precisa enfraquecer as resistências, de ambos os lados, realizar um trabalho estratégico de avaliação do estágio atual da organização em termos de preconceito e diversidade etária e, a partir disso, desenhar um programa sob medida. 

“As empresas que trabalham sério nessa questão fazem pouco alarde e sabem que o mergulho deve ser profundo, pois esse novo olhar demanda uma mudança de cultura, algo complexo de se fazer. Temos que enxergar sob a ótica do longo prazo, como exemplo, a life long career, que implica em novos desenhos de carreira, contratações para além das faixas etárias, formas mais flexíveis de trabalho -considerando diferentes maneiras de remuneração- e assim por diante”, comenta Fran.

Nesse processo de desconstrução da cultura também é importante a conscientização dos líderes em relação à importância da diversidade etária e geracional, para que o RH e os gestores saibam contratar e receber bem esses candidatos. “Além disso, tem o desafio da integração com os mais jovens. É preciso quebrar as barreiras e preconceitos que eventualmente existem para os dois lados”, esclarece Litvak.

Para Cris, a inclusão dos profissionais 45+ deve fazer parte das ações da empresa, que hoje priorizam, no geral, os marcadores sociais como LGBTQIA+, pessoas com deficiência ou negros. Para tanto, ela sugere a abertura de vagas apenas para os profissionais 45+, o fim de atitudes etaristas no processo seletivo, a criação de novos modelos de contrato e rotinas de trabalho e a promoção de ações educativas individuais e coletivas sobre o envelhecimento. 

“É inaceitável que profissionais maduros sejam demitidos por conta da idade, um ato totalmente discriminatório. Esse é o público que mais tem crescido e no qual se concentra a maior taxa de desemprego. Dispensar um profissional pelo seu nível de senioridade não condiz com o momento de transformação das empresas que, cada vez mais, estão adotando programas de diversidade e inclusão”, enfatiza a CDO da Talento Sênior.

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Foto de Mórris Litvak

Mórris Litvak

Na prática

Para auxiliar as organizações a mudarem seus paradigmas etaristas, o site Vagas.com lançou um estudo exclusivo sobre etarismo, em parceria com a Talento Incluir, que reúne mais de 10 mil candidatos e o RH de empresas, no intuito de conscientizar o mercado sobre o tema. Além disso, disponibilizou um curso nesse mesmo viés, com especialistas do mercado e voltado ao público de RH, que é a porta de entrada dos profissionais nas empresas. 

“Internamente, promovemos momentos de sensibilização e educação com os colaboradores. Abrimos vagas exclusivas para atrair recortes específicos para a empresa, com uma meta anual para contratação 50+. E realizamos treinamentos nos quais incentivamos nossos clientes a buscar pessoas maduras, por meio do nosso software de R&S (recrutamento e seleção)”, explica Renan Batistela, especialista em Diversidade e Inclusão no Vagas.com.

Já a Maturi, criada em 2015 com foco na recolocação do público 50+ e que hoje já conta com mais de 200 mil pessoas cadastradas, mantém a plataforma de vagas Maturi Jobs e trabalha na capacitação de empresas, com a realização de cursos, eventos e a disponibilização de conteúdos on-line para os profissionais com alternativas relacionadas ao mercado, promovendo o networking.

“A Maturi é um negócio de impacto social, que ajuda as pessoas a envelhecer com dignidade e, ao mesmo tempo, busca mudar a cultura etarista das empresas, por meio da educação do mercado, consultoria, treinamento sobre diversidade etária, integração geracional, e processo seletivo a partir do momento que a empresa está preparada para isso. Também atuamos com a atualização de profissionais 50+ dentro das empresas e, ainda, os auxiliamos na preparação da aposentadoria”, conta Litvak.

Benefícios que a geração prateada traz às empresas

Nos últimos anos, as habilidades comportamentais vêm sendo valorizadas nas organizações e são justamente essas competências que tendem a ser características das pessoas mais maduras. “O relacionamento interpessoal, a atenção, a calma, o saber como lidar com o cliente, o jogo de cintura, o olho no olho, a paciência e o colaborativismo são algumas habilidades que os mais velhos costumam ter e isso é muito positivo para complementar os mais jovens. A diversidade geracional traz pensamentos e pontos de vista distintos e, a partir do momento em que há um ambiente de troca e diálogo, existe uma complementaridade comportamental que resulta em inovação e criatividade”, explica o CEO da Maturi. 

Além desses benefícios, Fran acrescenta que, ao formar um time multigeracional, a empresa expande o seu pool de talentos, promove a transferência de conhecimento, torna mais assertivos os planos de sucessão, fomenta uma cultura inclusiva e aumenta a produtividade e a empatia com o cliente. “Essa representatividade contribui para a melhoria da imagem da empresa perante a sociedade, por meio do cumprimento de seu papel social”, afirma a consultora.

Caminhos para a recolocação no mercado

Estar alinhado às novas práticas, exigências e tendências do mercado, manter a mente aberta, expandir os limites e buscar atualizações técnicas e comportamentais são alguns caminhos que o profissional, a partir dos 45 anos, pode trilhar em sua busca por novas oportunidades de trabalho.

Para Litvak, "abraçar" a tecnologia é fundamental, afinal, ela abre portas e, por isso, é preciso vê-la como uma aliada e não como uma barreira. O profissional precisa entender, também, que hoje em dia as questões comportamentais são diferentes do que eram há 20, 30 anos e que, para se manter em uma empresa hoje, é preciso estar apto para trabalhar em um ambiente mais moderno, colaborativo, diverso e horizontal.

“As pessoas também devem considerar a mudança de área. Mas quando falamos em se reinventar e em transição de carreira, é preciso muito autoconhecimento para ter a humildade de saber que, eventualmente, é preciso dar um passo atrás. Também é válido pensar além do trabalho formal, do CLT tradicional, ou seja, no empreendedorismo, no trabalho autônomo ou na consultoria. Além disso, é necessário se manter constantemente atualizado com cursos, participar de eventos e ampliar o networking”, completa o CEO da Maturi.






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