Um novo rumo para os cursos de Administração - CRA-SP
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Um novo rumo para os cursos de Administração

Foco no desenvolvimento de competências e maior liberdade às instituições de ensino, que deverão manter uma gestão capaz de avaliar de forma eficaz o aprendizado dos alunos. As novas Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de Administração mostram que a área precisa encarar de frente as recentes transformações e se preparar para o desconhecido

Se o mundo, as relações em sociedade, o mercado de trabalho e as empresas mudaram, e muito, na última década, por que ainda formamos profissionais na área da Administração com base em necessidades de 15 anos atrás? Essa é uma pergunta que, agora, parece ter um prazo para acabar: no último dia 10 de julho, o Conselho Nacional de Educação – CNE aprovou as novas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) para os cursos de Administração. O texto, que ainda será homologado pelo Ministério da Educação - MEC, foi fruto de uma articulação entre diversos atores do cenário educacional e da sociedade e vem ao encontro de inúmeras necessidades amplamente debatidas nos últimos tempos.   

É, sem dúvida, um grande passo e uma enorme oportunidade para a área da Administração, mas também implica em grandes responsabilidades para as escolas, seus docentes e, claro, os futuros profissionais que se formarão com base nessas novas DCNs. Embora depois da homologação pelo MEC as instituições de ensino ainda tenham um prazo de três anos para se adaptarem às diretrizes e construírem seus projetos pedagógicos, é a partir de hoje que elas precisam estar atentas àquilo que pode ou não funcionar dentro de suas propostas.

  Edson Kenji Kondo 

Cronologia 

As discussões para a elaboração das novas DCNs tiveram início em 2018, no 29º ENANGRAD, evento promovido pela ANGRAD (Associação Nacional dos Cursos de Graduação em Administração) e que contou com a participação de Antônio Carbonari Netto, Antonio Freitas e Gilberto Garcia (conselheiros do CNE), do Adm. Roberto Carvalho Cardoso (presidente do CRA-SP) e de Paulo Barone (secretário de Ensino Superior). Depois deste primeiro encontro, várias ações foram promovidas pelas entidades. No CRA-SP, foi instituída a Comissão Especial (saiba mais sobre ela abaixo) que elaborou um documento com sugestões para as novas diretrizes, entregue para o conselheiro do CNE, Carbonari, no final de 2019. No início deste ano foi a vez da ANGRAD apresentar sua proposta. 

Embora produzidas de forma independente pelas duas entidades, as sugestões caminharam de maneira colaborativa e contaram, também, com a participação da Comissão Especial para análise das diretrizes do Conselho Federal de Administração – CFA. Para o presidente da ANGRAD, Edson Kenji Kondo, a atuação dessas instituições foi essencial para se chegar a um texto que contemplasse tanto a parte acadêmica como as necessidades práticas. “As novas DCNs foram fruto de um trabalho harmônico dessas três entidades. Se a ANGRAD é o contato direto dos docentes e discentes das escolas de Administração, o CRA e o CFA são os que acolhem os profissionais que entram no mercado de trabalho. A relação de interdependência, mas de clara separação dos seus campos de atuação, foi o que fez com que esse trabalho conjunto pudesse trazer resultado tão revolucionário para a comunidade da Administração, para as empresas e à sociedade como um todo”, acredita. 

       Carlos Antonio Monteiro

Competências e tecnologias 

O Adm. Carlos Antonio Monteiro, diretor-presidente da CM Consultoria e coordenador da Comissão do CRA-SP, lembra que as novas DCNs trazem diversas novidades, entre elas a contextualização do curso no mundo 4.0, a valorização de metodologias ativas, a maior autonomia das IES e o foco no desenvolvimento de competências. Esse último item, inclusive, é uma das principais necessidades a serem implementadas daqui para frente, conforme explica Irineu Gianesi, professor do Insper e presidente do Grupo de Trabalho que elaborou a proposta da ANGRAD. “Há uma preocupação mais forte com capacidade analítica, com pensamento computacional e com a habilidade de aprender a aprender, para que este profissional possa, ao final do seu curso de graduação, estar preparado para continuamente se adaptar a um futuro no qual gente sabe que algumas coisas estarão presentes”, elenca. 

É importante dizer que as novas DCNs se preocuparam, também, com aquilo que ainda se desenhará e será importante para o mercado de trabalho, o que justifica a maior flexibilidade nas orientações. “Acho que essas diretrizes têm um potencial de permanecerem válidas por mais tempo, justamente por trazerem a essência, em vez especificarem conteúdos ou modismos que podem ser muito interessantes hoje ou nos próximos dois anos, mas que não serão adequados para uma realidade daqui a cinco ou sete anos. Com essa flexibilidade os projetos pedagógicos poderão ser atualizados ainda dentro dessas diretrizes”, complementa Gianesi.

  Antonio Freitas

Essa preocupação em relação às competências também é destacada pelo Adm. Idalberto Chiavenato, conselheiro do CRA-SP e autor de diversos livros na área da Administração. Ele lembra que este item foi incluído na sugestão entregue pelo CRA-SP ao CNE e que o foco neste desenvolvimento contribui para a formação de agentes de mudança e inovação organizacional. “É preciso reunir competências administrativas, comportamentais, técnicas, sociais e cognitivas. Isso envolve conhecimento, habilidade, julgamento, atitude ética e empreendedora em um profissional completo para liderança organizacional”, enumera.  

Desafios para as IES 

É na flexibilidade e autonomia concedidas pelas novas DCNs que também moram o maior comprometimento das instituições, conforme explica Antônio Freitas, presidente da Câmara de Ensino Superior do CNE. “Até recentemente, quem ditava o que cada instituição iria aplicar, independente da sua região ou porte, eram as DCNs: quanto de matemática, quanto de marketing, quanto de logística. Hoje, em vez de 12 pessoas em Brasília determinarem o que todas as escolas devem fazer, sejam elas da capital paulista ou do interior de Pernambuco, cabe ao corpo docente de cada instituição essa responsabilidade.”

        Irineu Gianesi 

Para Freitas, isso também representa uma grande chance para as escolas menores, que têm a possibilidade de desenvolver currículos diferenciados e atender às necessidades específicas de determinado setor ou região, deixando, assim, de competir com instituições de renome, oferecendo mais oportunidades aos profissionais. “Quando eu permito que as escolas pensem em formar egressos distintos, eu amplio o mercado de trabalho. Agora, a qualidade do curso só dependerá mesmo da instituição. E não há desculpa: você tem que aplicar uma forma de aprendizagem que motive os estudantes. E não dá para aplicar a mesma pedagogia para um aluno que estuda de manhã na USP e para aquele que trabalha o dia todo e assiste às aulas à noite”, esclarece. 

Avaliação constante

Outra importante mudança para as instituições diz respeito à gestão da aprendizagem, um modelo que prevê o planejamento, a implementação e, principalmente, a avaliação sobre o desenvolvimento dos alunos. Para Taiguara Langrafe, conselheiro do CRA-SP e ex-presidente da ANGRAD, essa prática segue uma tendência utilizada por acreditadoras internacionais e escolas de negócio de ponta e é um dos pontos principais das novas diretrizes. “Neste modelo, eu avalio o tempo inteiro se os alunos desenvolveram competências conforme o que foi planejado e, assim, vou trabalhando na medida em que identifico eventuais lacunas ou não”, explica. 

Embora esteja claro que essas mudanças são benéficas para a formação dos futuros profissionais, Gianesi lembra que muitas escolas terão um longo trabalho pela frente. “Algumas instituições ansiavam por essa flexibilidade, mas isso certamente vai tirar da zona de conforto outras instituições”, prevê, ao lembrar, ainda, da capacitação dos professores. “Outra característica fundamental é a preocupação com o corpo docente e com a sua formação pedagógica, dado que não basta o professor ter o conhecimento sobre o conteúdo, ele precisa ser apto e hábil para fazer a mediação do processo de ensino-aprendizagem”, anuncia. 

  Idalberto Chiavenato 

O futuro da Administração 

Mais do que se adaptar à nova realidade do mundo, a construção das diretrizes pretende resgatar o interesse dos alunos pela profissão. Para o presidente da ANGRAD, embora essencial em todos os setores, muitos estudantes deixaram de procurar a Administração pois houve um “desacoplamento entre o curso e as necessidades dos jovens, que viam um mercado em rápida transformação, digitalizando-se, criando novos serviços, canais de entrega, modelos de precificação e maneiras de trabalhar em redes”. Ele acredita, no entanto, que este cenário deve se modificar. “A área da Administração não é mais nem menos importante que as outras, mas as novas DCNs abre perspectivas para que ela se posicione como um elemento capaz de turbinar a efetividade de todas as outras áreas”, acredita Kondo. 

Para quem ainda vê distante a implementação dessas mudanças, o professor Chiavenato lembra que o processo educacional leva anos e gerações e que, por isso mesmo, é preciso projetar um horizonte de longo prazo, porém flexível. “É preciso criar algo que será recriado e reconstruído com uma frequência cada vez mais rápida”, finaliza. 

Comissão do CRA-SP

A Comissão Especial do CRA-SP, instituída em 2019, foi responsável por redigir sugestões para as novas DCNs. Sob coordenação do Adm. Carlos Antonio Monteiro, ela contou também com a participação de Idalberto Chiavenato, Amyris Fernandez (professora da FGV), Mario Cesar Barreto Moraes (presidente da Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior – CONAES) e Gustavo Galindo (assessor do CRA-SP). 

Para o presidente do Conselho, Adm. Roberto Carvalho Cardoso, a preocupação em contribuir com a construção das DCNs reforça a atuação do CRA-SP em ações que visam colaborar para o avanço da área. “Estar a serviço da Administração é muito mais do que um slogan para nós. É um compromisso firmado com profissionais, estudantes, empresas, professores, instituições de ensino e sociedade em geral. O trabalho da Comissão foi excepcional e contribuiu, de forma significativa, para a aprovação das mudanças necessárias”, ressalta.  

A professora Amyres acredita que as novas diretrizes trarão amplos benefícios para todos. “Muitas coisas mudaram, exigindo que as disciplinas e as metodologias de ensino sejam atualizadas, sempre lembrando que o centro de tudo isso é a produção de profissionais que atinjam locais de liderança e que façam com que toda a sociedade avance”, sintetiza. 

Essa também é a constatação de Monteiro, que ainda espera que as novas DCNs possam proporcionar às IES a criação de um curso contemporâneo e a formação de profissionais dotados dos mais atuais modelos de gestão e tomada de decisão, adaptados a um mundo volátil, incerto, complexo e ambíguo. “Dessa maneira, poderemos retomar o orgulho e a admiração do mercado de trabalho e da sociedade brasileira pela profissão, que é um dos alicerces para o desenvolvimento do País”, acredita, ao também destacar que o conhecimento e a experiência dos membros da Comissão fizeram toda a diferença na elaboração das sugestões. 




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